José Gomes Ferreira
Sic Online
Começo por confessar: não conheço muito em pormenor a regulação do mercado da electricidade, tal como imagino que muitos jornalistas, apesar de especializados na área económica, também não conheçam profundamente esta matéria bastante complexa. Mas há factos que só podem ter uma interpretação: durante muito tempo, várias entidades andaram a esconder a realidade aos consumidores portugueses de energia, seja de electricidade, gás ou outros combustíveis. Factos: a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos propôs ao Governo, no final do ano passado, um aumento de 15,7 por cento no preço da electricidade para os consumidores domésticos. O presidente da ERSE era Jorge Vasconcelos. Primeiro, o Governo entrou em contradições. Depois anunciou que o aumento máximo não podia ultrapassar os seis por cento. Zangado, Jorge Vasconcelos viria a bater com a porta porque estava em causa a independência do regulador do mercado. Na altura, comentei na antena da SIC que a questão de fundo, que ninguém queria discutir em Portugal, era a elevada margem de lucro dos produtores de electricidade. Lembrei que, em Espanha, o também elevado aumento do preço da electricidade proposto pelo regulador tinha sido evitado pelo Governo de Madrid, porque se sentou à mesa com os produtores e convenceu-os a reduzirem as suas margens. Lembrei que os lucros da EDP iam atingir um valor recorde em 2006, tal como os da Galpenergia, num ano em que o preço do crude tinha disparado. Isto é, os consumidores de electricidade, gás, gasolina e gasóleo estavam a ser duplamente penalizados. Na altura, sobre estas observações, fez-se um silêncio incómodo. Nem EDP, nem Galpenergia, nem Governo, nem reguladores, ninguém disse uma palavra. Apenas recebi um telefonema de um responsável de uma produtora de electricidade, para uma conversa em off, dizendo-me que eu não tinha razão. Mas não quis prestar declarações públicas... Já no início deste ano, o Governo disse que era necessário investigar a eventual concertação dos preços dos combustíveis e a Autoridade da Concorrência anunciou a abertura de uma investigação. A mesma entidade publicou entretanto um relatório a dar conta da coincidência de preços dos combustíveis e a dizer que os preços do gás engarrafado em Portugal - antes de impostos - são muito elevados face a outros países europeus. Esta quarta-feira, o presidente da ERSE foi ao Parlamento dizer que o aumento das tarifas eléctricas para os consumidores domésticos em 2007 podia ter sido inferior a 6 por cento e que o Governo podia ter negociado com os produtores uma redução dos proveitos. Disse também que "todos os Governos, sem excepção, desde 1997 até hoje, beneficiaram os produtores de electricidade à custa dos consumidores". Finalmente, Jorge Vasconcelos pôs o dedo na ferida. Ainda bem que o fez. Mas fê-lo quando já não é presidente da ERSE. Não podia ter levantado a questão antes, quando propôs os tais 15,7 por cento de aumento da electricidade? E o Ministério da Economia, de que está à espera para lançar a discussão sobre este assunto em Portugal?
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