quarta-feira, julho 20, 2005

O Regresso do 'Lápis Azul' ?...ou pior?

O Governo quer dar poderes à nova Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) para entrar nas redacções e instalações das empresas dos media sem mandado judicial, para proceder à sua fiscalização. De acordo com a proposta de lei do Governo, colocada online pelo Executivo no seu portal, a ERC fica livre para proceder à "divulgação das informações obtidas" e da "identidade dos operadores sujeitos a processos ainda em fase de investigação", bem como da "matéria a investigar".

O mesmo documento propõe que "os funcionários e agentes da ERC, os respectivos mandatários, bem como as pessoas ou entidades qualificadas devidamente credenciadas que desempenhem funções de fiscalização no exercício das suas funções e que apresentem título comprovativo" possam "aceder às instalações, equipamentos e serviços das entidades sujeitas à supervisão e regulação da ERC; requisitar documentos para analisar e requerer informações escritas; identificar todos os indivíduos que infrinjam a legislação e regulamentação, cuja observância devem respeitar, para posterior abertura de procedimento".

Os artigos 40.º ( Funções de Fiscalização) e 48.º (Exercício da Supervisão, alíneas 5 e 6) da proposta de lei definem ainda que os agentes da ERC podem, depois das investigações nas redacções, "reclamar a colaboração das autoridades competentes quando o julguem necessário ao desempenho das suas funções".

CRÍTICAS. Estes artigos, entre muitos outros, já mereceram da Confederação Portuguesa de Meios de Comunicação Social (CPMCS) duras críticas, em documento entregue ao Governo e num resumo enviado aos diferentes grupos parlamentares. Segundo esta associa- ção, que agrega ainda a Associação Portuguesa de Imprensa (AIND), os dois artigos "permitem buscas (que devem, em todos os casos, ser objecto de mandado judicial) sem qualquer aviso prévio, desproporcionais, pelo que é indispensável salvaguardar o segredo comercial, o segredo das fontes de informação e o próprio funcionamento normal da actividade comunicacional".

"De qualquer forma", acrescenta a mesma associação, "esta competência não é adequada aos objectivos da regulação do sector dos meios de comunicação social", sublinhando que "as referidas buscas só deverão ter lugar mediante a exibição de mandado judicial para o efeito, nos termos do Código de Processo Penal, e sob pena de violação de direitos constitucionalmente consagrados". Relativamente à divulgação das informações recolhidas nas buscas, da identidade dos operadores ou da matéria a investigar, a Confederação de Meios considera-a uma situação inaceitável. Sobretudo "enquanto não houver qualquer acusação ou imputação formal", pelo que "estes números devem ser eliminados da lei", conclui.

Em declarações ao DN, o secretário-geral da confederação, Francisco van Zeller, reforça a dúvida quanto a legalidade da proposta, acrescentando que a mesma reflecte "alguma falta de bom senso".

INCONSTITUCIONAL? Consultado pelo DN, o constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia explica que a lei "pode ser inconstitucional no caso de a intervenção da ERC afectar os direitos fundamentais da inviolabilidade do domicílio ou do sigilo profissional, ambos passíveis de ser investigados apenas com autorização dos juízes". Porém, "a partir do momento em que a Assembleia da República proceda a uma alteração constitucional para criação de uma entidade reguladora, é legítimo que esta exija a cooperação de todos", conclui.

Sindicato. Para o Sindicato dos Jornalistas (SJ), a questão do sigilo profissional é incontornável e limita qualquer tipo de fiscalização.

"O sigilo profissional preserva a redacção ou os arquivos do jornal. Mas um motorista também está impedido de dizer aonde se deslocou com uma equipa de reportagem", disse ao DN Alfredo Maia, presidente do SJ. O jornalista referiu que a questão do sigilo foi acolhida pelo Governo em alguns pontos do projecto de lei da ERC.

O dirigente sindical frisa que esse tipo de fiscalização só pode ser feito com um mandado judicial autorizado por um juiz , segundo critérios precisos, quer se trate da Entidade Reguladora ou da PJ".

(DN online)

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